Prosa em verso
Encontros dispersos
Garrafas espalhadas, cigarros
Suor e sorriso
O abraço sem motivo
Ou todos os motivos num só
Conversa séria e bobagem
Numa igual fluência – inexplicável
É...somos nós
Não é onde, nem o que:
É com quem.
Meu amor, não houve nada. Quase nada. Eu quase não estremeci quando ela me tocou. Seu hálito quente e sua voz rouca atiçaram só alguns dos meus sentidos. Não quero que penses que ela tem algum poder sobre mim. Só quis ver até onde ia minha resistência, por isso permaneci imóvel, enquanto ela me circundava, de perto – muito perto. Seu cheiro, mistura de uma infinidade de aromas que não sei definir, me inebriava, mas isso é coisa sem a menor relevância. E quando ela comprimiu minha mão contra o seu corpo, deixei que ela guiasse todos os meus movimentos porque não queria participar daquilo – pelo menos, não ativamente. Até fechei os olhos para não ver. Acho que nem senti muitos arrepios quando seus dentes mordiscavam minha nuca, ou quando sua língua explorava, ao mesmo tempo leve e ousadamente, minha orelha. Os sussurros, entao! Causaram um impacto ainda menor. Acho que nem vou continuar te contando isso, afinal, não foi nada. Quando resolvi não ser mais passivo àquele assédio, e minha mão começou a passear por baixo da sua blusa, não sabia muito bem o que estava fazendo. Nem quero falar de quando comprimi o corpo dela contra o meu – se é que isso era possível. Nem de quando seu ventre, a essa altura já descoberto, tocou o meu. O corpo dela estremecia a cada avanço ousado das minhas mãos e da minha língua. Mas eu não queria provocar esse efeito. Não foi minha culpa. Seu corpo entregue, como que desfalecido em meus braços, não deveria significou nada. Ainda bem que fomos abruptamente interrompidos. Ah, você quer saber por que eu estou suando? Meu bem é verão. O que você esperava? Minhas pernas?Trêmulas? Ora, minhas estão trêmulas porque...porque...
Esse número não existe. E o choro não consegue sair da minha garganta. Um nó, sabe? Aquele. E nessa madrugada em que a primavera mais parece um inverno cortante, a moça insiste em dizer que não existe. Não existe como aquele disco tocando na vitrola que eu não tenho e aquela máquina de escrever no canto do sótão que inventei. Agora nenhuma palavra faz sentido do lado de dentro. De repente tenho tanto medo de me perder de mim. Me errar como se erra o desfecho de um conto. Então escrevo. Por que essa agonia está ardendo e esse amor não alcança o coração. Sempre achei que o amor acabava quando a gente não consegue mais se ver dentro do olhar do outro. E agora? Não entendo. Não posso me ver e mesmo assim ainda sinto o seu coracão batendo por trás das minhas costelas. O relógio rodou por aí? Por aqui o tempo ainda congela. Fito um relógio de cordas quebradas. Estou escrevendo só pra sentir que fomos mais que a carne derramada sobre a cama. Pra dar o adeus que me acompanha. Parei aqui. Adeus.
Por Betânia Barreto
Cansei de me ver em você, fazer tudo por você
E tendo como conseqüência esquecer de mim.
Passei várias noites sem dormir tentando imaginar
Quando você iria parar com as tuas passagens
Por outros lares e com suas falsas desculpas
Tentando me convencer de que as coisas que eu sei e vejo
Não são reais, que são apenas falsas convicções.
Não posso entalhar um falso sorriso com toda essa situação.
Irei enrijecer minha atitude, e não volto atrás.
A esperança para mim morreu
Zelino é um extra-terrestre que, vez por outra, vem dar um passeio na Terra. Ele gosta de aprender sobre cultura, filosofia, ciência e religião das sociedades que habitam nosso planeta. Frequentemente ele conversa com alguns terráqueos, especialmente com Domingos. Numa dessas conversas, Zelino tenta aprender tudo sobre uma festa tradicional da cultura ocidental do planete Terra: o Natal.
- Domingos, o que tá acontecendo, que tá todo mundo nessa agitação aqui na Terra – todo mundo correndo pra as compras, lojas decoradas?
- Ah, é por causa do Natal?
- O quê?
- O Natal. É uma festa que a gente comemora todo ano, na noite de 24 e no dia 25 de dezembro.
- Ah...e o que vocês comemoram?
- Ah, Zelino, tem Papai Noel, ceia, as pessoas compram presentes...as lojas ganham muito dinheiro nessa época.
- Tá, mas qual a origem disso tudo?
- Poxa...eerr...ah, lembrei: a gente comemora o aniversário de Jesus Cristo!
- Hum...ah, então esse cara deve ser bastante sortudo, hein! Pra todo mundo gastar dinheiro com presente pra ele!
- Não, Zelino. Pelo contrário: ele era pobre – “era” porque já morreu. As pessoas compram presentes para umas para as outras.
- Sei...vocês comemoram o aniversário de alguém que já morreu comprando presentes pra vocês mesmos.
- É mais ou menos isso.
- E esse tal de Papai Noel? Ele é o pai de Jesus?
- Hahahahaha...não, Zelino. Papai Noel é...ah, não sei direito como ele entrou na história do Natal. Só sei que ele não tem nada a ver com o nascimento de Jesus, não. É aquele velho de vermelho que tá com uma criancinha no colo. Na verdade, aquele ali não é tão velho.
- Deixa ver se eu entendi: é um velho que não é velho, que gosta de colocar criancinhas no colo e que, no fim das contas, não tem nada a ver com a história?
- É por aí.
- E aquelas arvorezinhas ali cheias daquele negócio branco? E aqueles veadinhos?
- Na verdade, são árvores de plástico, e aquilo branco é neve. E os animais não são veadinhos: são renas.
- Eu não sabia que no Brasil costumava nevar. Nem que havia renas aqui.
- De fato, aqui não tem neve nem rena.
- Então é tudo de mentira.
- Nem tudo. O Espítiro Natalino é verdadeiro.
- E como é isso?
- No Natal, as pessoas se abraçam; se estiverem de relaçoes cortadas, elas se reconciliam...
- As pessoas esperam um ano para serem cordiais umas com as outras? Isso é o Espírito Natalino?
- Mais ou menos.
- É...esse tal Espírito deve estar custando caro, né?