quarta-feira, 10 de novembro de 2010

EM BOA HORA


Sentada na cama, ela dobra sua roupa. A mala no chão, aberta, esperando para ser preenchida com seus pertences.Levaria só o que era seu, e mais nada. Demorava-se em cada peça que dobrava. Não por cuidado, mas por falta de ânimo. Seu entusiasmo havia se esvaído ao longo dos anos. Enquanto colocava cada peça de roupa na mala, lembrava de todos os momentos importantes daquela relação, inclusive – e principalmente – os mais tristes. Ela não se permitiu chorar. Lágrimas por que? Pelas mesmas coisas? Pelas tentativas repetidas em vão? Não, não choraria.

Fechou a mala com alguma dificuldade - estava cheia e pesada. Não eram só roupas e objetos pessoais que ela carregava: era também o peso da melancolia, de anos de frustações. Mas ela havia tentado – disso, tinha certeza.

Deixava para trás alguns objetos mas não estava certa se voltaria para buscar. Logo estaria longe dali. Bebeu um copo d’água e sentou-se à beira da cama, como se refletisse, mas logo se levantou e, com movimentos lentos, cruzou a porta pela última vez. Girou a chave na fechadura com a apatia dos que já não esperam mais nada da vida. Preferiu descer pelas escadas – morava no primeiro andar. Arrastar a mala por aqueles degraus era como um ritual, uma celebração do vazio, do nada.

Chegou à calçada e logo chamou um táxi. Entrou no carro e olhou pela última vez aquele prédio. Nunca havia reparado antes, mas o edifício era de um amarelo desbotado, sem vida. Era uma contrução um tanto antiga, e o tempo fora cruel com ele. “O prédio foi desgastado pelo tempo...teve sorte...” – pensou. O táxi arrancou enquanto ela ainda olhava o prédio. Sem vida. Ambos.